Bitcoins – A volatilidade Negativa e o Risco do Negócio
No mercado de renda variável o investidor aposta na volatilidade do ativo, isto é, compra-se o produto e se, ao longo do tempo, o valor cair tem-se um prejuízo (volatilidade negativa), mas se o preço subir então se tem um lucro. Assim, em apertada síntese, funciona o tradicional mercado de ações e também o recente mercado de Bitcoins.
Contudo, neste mês, no site de reclamações “Reclame Aqui”, há depoimentos de pessoas que supostamente perderam seus investimentos em moeda criptografada porque o prestador de serviço de compra e venda de moedas transferiu para terceiros cotas de Bitcoins sem a devida autorização do cliente.
O interessante é que quando se observa as respostas das empresas que prestam serviços de compra e venda do referido ativo, parece que há a intenção de repassar ao cliente (investidor) a responsabilidade pela falha no procedimento de validação da ordem de serviço que o próprio fornecedor idealizou e disponibilizou ao mercado.
Isso fica claro no momento em que o fornecedor sugere que o cliente pode ter sido vitima de crime digital (Phishing) e, por essa razão, alguém de posse dos dados reais autorizou a transação de modo que o fornecedor nada pode fazer; portanto, conclui o prestador de serviço: a culpa é exclusiva da vítima.
A questão que se apresenta no problema supramencionado é de relação de consumo. – A falha operacional do provedor de serviços não deve ser repassada ao cliente porque se trata de risco inerente ao negócio, exceto, é claro, se for comprovado que o cliente contribuiu de forma ilícita para a ocorrência do fato.
Aliás, esse problema da autorização para a execução de um serviço já foi equacionado no modelo de negócio clássico: o cliente assina de forma irrefutável uma ordem de serviço e pronto. – Simples assim!
Na era digital, os negócios suportados por plataformas tecnológicas devem se valer de recursos técnicos que ofereçam, no mínimo, a mesma segurança do modelo clássico; por exemplo, a assinatura digital que se utiliza da tecnologia PKI (Public Key Infrastructure) é uma das técnicas disponíveis para gerar documentos digitais com validade legal no Brasil, porque tem as três propriedades básicas: autenticidade: o receptor deve poder confirmar que a assinatura foi feita pelo emissor; integridade: qualquer alteração da mensagem faz com que a assinatura não corresponda mais ao documento; irretratabilidade ou não-repúdio: o emissor não pode negar a autenticidade da mensagem. [01]
Ora, se o prestador de serviços de compra e venda de Bitcoins define uma plataforma de negócios em desconformidade com o modelo clássico de emissão de ordem de serviço ou, ainda, não se utiliza dos recursos tecnológicos que autenticam de forma irrefutável e irretratável a emissão da ordem (pedido de compra, venda e transferência de titularidade), então esse risco operacional não deve ser repassado ao cliente porque se trata de um risco do negócio.
Portanto, os investidores que perderam suas cotas devem buscar o apoio de um consultor jurídico para analisar a questão e, se for o caso, resgatar judicialmente a moeda usurpada porque o único risco que o investidor deve suportar no mercado de Bitcoins é a volatilidade negativa da moeda.
Manoel dos Santos da Silva é Advogado da MS Silva - Advocacia, OAB/SP 356.674; Administrador de Empresas pelo Centro Universitário FEI - (ESAN-SP); Especialista em Administração com ênfase em sistema da Informação pela FGV-SP — CEAG; Mestre em Engenharia da Computação pelo IPT-SP; e mediador Extrajudicial e Judicial. email: manoelssilva@adv.oabsp.org.br. Site: www.manoelssilva.com.br